Há uma crescente esperança no uso de células tronco no tratamento do autismo, mas ainda não há evidências científicas de sua eficácia e segurança

Como sabemos, o autismo não é uma doença, portanto não há cura. Além disso, o único tratamento cuja eficácia é comprovada com evidências científicas é a intervenção comportamental através da Terapia ABA.
Contudo, nos últimos anos geneticistas, microbiologistas e pesquisadores de outras áreas têm investigado a possibilidade de criar um tratamento, ou mesmo erradicar os sintomas do autismo usando o transplante de células tronco.

A discussão a respeito do assunto surgiu ainda na década de 90, mas ganhou força a partir de 2013, em um artigo feito por pesquisadores chineses e publicado pelo Journal of Translational Medicine. Na ocasião, a combinação de transplante combinado de células mononucleares do cordão umbilical e células-tronco mesenquimais derivadas do cordão umbilical mostrou maiores efeitos terapêuticos quando combinadas.

Os pacientes submetidos a terapia celular apresentaram um avanço em relação a consciência corporal, fala e hiperatividade, 24 semanas após a infusão das células-tronco.

Desde então, vários outros estudos passaram a investigar a relação entre autismo e células tronco, impulsionados por fundações científicas financiados por laboratórios especializados no transplante de células troncos. Como consequência, a possibilidade de tratamento passou a ganhar popularidade entre pais e pessoas com autismo nos Estados Unidos, a ponto de pais pagarem até US$ 15 mil para participar de tratamentos experimentais.

E é aí que mora o perigo.

Embora o tema tenha sido foco das atenções de fundações e laboratórios especializados em pesquisas de células tronco nos últimos anos, ainda há muitas dúvidas sobre a eficácia do tratamento e inclusive sobre se ele é  de fato seguro para os pacientes.

Um ensaio clínico de 2018 no Sutter Institute of Medical Research em Sacramento, Califórnia, encontrou “evidências mínimas de eficácia clínica” de infusões de sangue do cordão umbilical aplicada em 29 crianças autistas.

O registro de ensaios clínicos do National Institutes of Health lista 11 outros ensaios com células-tronco relacionadas ao autismo – mas 3 foram concluídos anos atrás sem registrar nenhum resultado, 3 estão listados com um status ‘desconhecido’ e 2 foram retirados.

A maioria dos estudos foram executados fora dos EUA — o que dificulta o acompanhamento preciso e a checagem da informação pelo órgão americano — e nenhum randomizou os participantes para receber a terapia ou o placebo, que é considerada a abordagem padrão ouro em ensaios clínicos.

O ceticismo dos pesquisadores pode ser exemplificado pelo estudo “Cell therapy approaches to autism: a review of clinical trial data”, do neurocientista Jack Price, da universidade britânica King’s College London.

Uma vez que todos os estudos afirmam mostrar que sua metodologia é segura, outros estudos não controlados parecem difíceis de justificar. O objetivo dos ensaios de fase I / II com rótulo aberto é demonstrar segurança. Se isso for alcançado, estudos adicionais serão redundantes e, portanto, antiéticos. Claramente, a única maneira de sabermos se as terapias celulares podem ter um impacto no TEA é por meio de estudos adequadamente controlados por placebo. Isso é contestado por alguns, mas continua sendo a posição majoritária entre os reguladores e os próprios cientistas clínicos [34]. Aproximadamente 90% dos medicamentos falham em ensaios clínicos e a maioria falha por razões de eficácia ou segurança [35]. Os dados sobre terapias avançadas são atualmente muito escassos para serem analisados de forma robusta, mas a natureza experimental dessas terapias significa que sua taxa de sucesso provavelmente não será maior. Isso significa que a grande maioria dos pacientes que participam de estudos como os considerados aqui está recebendo tratamentos inseguros, ineficazes ou ambos. Os pais e os médicos fariam bem em lembrar que esses pacientes, em sua maioria, são crianças, incapazes de dar consentimento. Em muitos casos, a qualidade de vida futura é muito difícil de avaliar. Quão legítimo é expor esses indivíduos a riscos com uma probabilidade de sucesso tão baixa?

O que a Casulo pensa
Nós, da Casulo Comportamento e Saúde, somos entusiastas da ciência e acreditamos que apenas tratamentos baseados em evidências científicas devem ser usados para os casos de autismo.
É claro, ficamos esperançosos por novas possibilidades e informações que possam nos ajudar a entender o espectro e a melhorar a qualidade de vida das pessoas com TEA.

Entretanto, sublinhamos a necessidade de que toda descoberta científica precisa passar por vários critérios. No momento, ainda não há provas que garantam o uso das células troncos para reduzir características ou mesmo reverter quadros de autismo.

Por isso sugerimos muita cautela a esse e outros tratamentos experimentais que não tenham passado pelos testes necessários ou que ainda não possuam informações a respeito.

Outras fontes:

https://translational-medicine.biomedcentral.com/articles/10.1186/1479-5876-5-30

https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2021/01/10/celulas-tronco-auxiliam-no-tratamento-de-autismo-mostra-estudo.htm

https://translational-medicine.biomedcentral.com/articles/10.1186/1479-5876-5-30#article-info

https://molecularautism.biomedcentral.com/articles/10.1186/s13229-020-00348-z

https://translational-medicine.biomedcentral.com/articles/10.1186/1479-5876-11-196

https://www.neurogen.in/assets/frontend/pdf/scientific-publications/Autism/15-Autism.pdf

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